domingo, 29 de janeiro de 2012

A noite dos ditos


Ata referente ao dia 28 de janeiro de 2012.

Não há escuridão que possa apagar a luz de uma vela, já dizia a sabedoria popular. E o Clube do Conto é vela acesa.

Quem passou ontem pelo Shopping Sul pôde ver nosso amado Clube do Conto em seu sol de quintal. Numa combinação que não foi combinada, Laudelino Mene\es, Sérgio Janma e Norma Alves vestiam verde, mas só para destoar, Carlos Cartaxo e eu vestimos outra cor.

Verde é a cor da esperança! Mais um dito popular, agora citado por um clubista, mas penso eu que nada é de uma cor só, nada é só e pronto. A esperança, por exemplo, é de todas as cores e é ela o que faz as pessoas acordarem mais cedo para fazer café. Esperança também é a minha vizinha e é um inseto que dizem trazer muita sorte. É o assobio dos fantasmas à procura da luz. E é o que determina se as coisas serão ou não eternas!

Romarta Ferreira

domingo, 22 de janeiro de 2012

Duas atas, um dia


Ata referente ao dia 21 de janeiro de 2012.

ATA DA HUMILHAÇÃO*

chega o primeiro contista humilhado
já em esperar os outros não chegam
porém aos poucos um a um tardejam
noturnos todos fora de tempo nublado

desejam contar contudo não sentam
sentem não terem ainda começado
pedem o pedido prontamente negado
atrasadas que são as suas ampulhetas

opressos se apressam em sair do lugar
e mal-vindos vão tristes cabisbaixos
se enfileirando fuleiros sem lar

indianamente seguem andar abaixo
em promessas de cedo pro sol que virá
mas sei que só hoje pois baixaram seus fachos

* tema do próximo sábado

ATA DA REDENÇÃO

comparecem sete de mentiroso conta
contando duas fêmeas Romarta e Anne
Catão que não contam nem fora da fome
como os três machos mojados aprontam

Sérgio um suicídio de vazio vasilhame
Beto a cantar um vazio que nem conta
e André prisioneiro requentado reconta
apenas Joedson entre os homens

sem fé no café se apresenta no tema
com um come-come de crianças na janta
mas o destaque é Norma sem pena

menos pela quale e mais pela quanta
pois lê logo três sem sebo a dona
fode o órfão e o fudido na planta

Joedson Adriano

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Conto de Sérgio Janma


Mais uma estreia no blog do Clube, conto inédito de Sérgio Janma.

* * *


ISCA DE PEIXE E ESPINHAS

E que Shiva dance para ele a dança criadora de um novo mundo, podendo nele viver refeito.

A noite começou para Dartagnan com seu torpedo para sua ex-mulher e sempre amiga: - Tô angustiado. - Ponto. Só isso. E nenhum torpedo em resposta. Sem os remédios que o fazem dormir, sua angústia crônica levou-o então para as ruas. Caminhou-e-caminhou. Chegou a uma pizzaria onde talvez encontrasse seu melhor amigo. Não estava lá. Lá ficou. A música era boa. Anos 80. Saudosismo de cinqüentões. Na pizzaria não quis pizza. Pediu isca de peixe só para recordar e homenagear um tempo bom de Olinda que acabou mal. Também pediu uma cerveja e vieram logo três em um balde com muito gelo. O garçom adivinhou o quanto o seu organismo agüenta beber, ou serviu mais de uma para lhe poupar o trabalho de ser chamado tão cedo? Dartagnan achou que não terá que pagar as que não beber.Desliga o celular. É uma maneira de tirar férias do mundo, já que não consegue tirar férias de si mesmo.Depois das cervejas vem a isca. Após lambuzar a primeira fritura em um molho rosa, Dartagnan abocanha-a por inteira. - Coff! Coff! Coff... - Epa! Uma espinha atravessou sua garganta! - Já não se fazem isca de peixe como antigamente -, resmunga. - Antes era só com filé. Essa que serviram nem desossaram, pondera em silêncio, resignado. Poderia até ser uma metáfora: quando se isca o passado,ele vem inteiro: carne e ossos. Difícil de engolir como essa isca; ambos engasgam. A boa música mantém Dartagnan ali. Repara o ambiente. Na mesa em frente, o gordo casal balança os ombros ao ritmo da balada romântica. Os que estão à sua direita falam em inglês... acha, ou em alemão, sabe-se lá, com a música alta não dá mesmo para ouvir direito. A mesa a sua esquerda o deixa em dúvida. Das duas, uma: como gesticulam muito, ou eles falam por Libras, ou são italianos.Sente vontade de ir ao banheiro na metade da terceira cerveja. Onde é que fica? Na sua procura pelo alívio imediato não cruza com nenhum garçom para perguntar. Decide se deixar guiar pelo cheiro peculiar. Para sua felicidade, acha a gaiola dos desesperados com facilidade. Dartagnan percebe que o programa para o resto da sua noite seria aquele. Bom para no máximo uma hora. Pede a conta. Volta de táxi.Em casa, pensa no amanhã e no que ontem disse sua atual ex-mulher. Essa mulher, por ser amiga, ainda está presente no seu presente. Diferentemente da sua primeira ex-mulher que está em um passado que ela teima em querer fazê-lo presente. Sua amiga-e-mais-recente-ex-mulher disse que amanhã talvez fosse vê-lo. Talvez... talvez ele use sua isca e a puxe para dentro fechando a porta, aperte a bunda rija da moça ao encontro do seu rijo pau em riste. Ou feche a porta, deixando-a do lado de fora, depois de dizer – com licença, não me leve a mal,  fica aí no meu passado, fora da minha casa, fora de mim. Talvez Dartagnan precise ficar só. Sem querer o mundo que acabou e que, por isso, não pode ser mais seu.Tenha talvez que parar de lançar suas iscas ao passado na intenção de pescar as sobras do que era gostoso pelo seu frescor. Porque o peixe do passado apodreceu. Trazê-lo, pela simples lembrança do prazer que ofereceu, o sufocará com as únicas coisas que sobraram: suas espinhas.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Bate-papo em ata

Ata referente ao dia 7 de janeiro de 2012.

Betomenezes: André, o que você achou da reunião de ontem [7/1/2012]?

André:  Um começo tímido em que pedaços de membros antigos se juntaram a outros apêndices e fizeram uma criatura móvel feito de cadeiras, textos e escutas...

Betomenezes:  É, não posso deixar de falar do começo nada silencioso onde cada um trazia coisas do novo ano para dividir entre a gente. Valéria, como sempre, era a mais jovem de nós. Não foi?

André:  Valéria abriu o playground e muitos demoraram a pular no balanço... acompanhar Valéria não é fácil e requer um mínimo aquecimento...

Betomenezes:  Norma ao levar quatro contos já mostrou que este ano não morreremos de inanição por quantidade, nem por volume, é só ver as quatro páginas de filosofia do país da maravilhas que Akuma nos levou.

André:  E estou vendo que a tendência é, caso o clube fique enxuto em membros, muitos se animarão a trazer mais de um texto para leitura... de toda forma, como o clube é imprevisível, acho que este ano possivelmente outros loucos pintarão.

Betomenezes:  não sei, deve ser o verão, mas, pelo sim, pelo não, sempre nesse período há uma renovação, o clube se encorpa de energia. Uma vontade nova de devorar as folhinhas dos calendários para chegar no próximo sábado. Qual é mesmo o tema?

André:  Desconfio que ouvi a palavra e ela escorregou... é possível que o tema tenha saído de alguma citação do encontro.

Betomenezes:  ah, me lembro agora, fome, claro, fome.

André:  Sim, veio do livro. E pelo visto, Norma, Valéria, Joedson, Wander, Laudelino, F. P. Andrade, Vivi (que saiu mais cedo) e tu, aprovaram.

Betomenezes:  Pronto, agora é devorar o teclado e preparar o conto novo. Até mais!

André:  Até!

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Thiago Arruda - Sessão de Contos (14)


A Sessão de Contos é um "programa" do nosso blog que exibe para todos os internautas contos dos participantes do Clube.

Nesta semana, temos a estreia de Thiago Arruda aqui no blog!

***

AS SOMBRAS SABEM. AS SOMBRAS SÃO CÚMPLICES.

Sei que, quando essa vela acabar, vai incendiar aquela palha e finalmente pôr isto aqui abaixo. Sei que, quando ela acabar.

Não olho para ela. O fogo pede meu olhar, que eu nego. Não devo respeito nenhum a quem pode me destruir. 

A sombra da cadeira observa tudo, flamejante. As sombras sabem. As sombras são cúmplices.

Vejo como o pavio queima, como a chama lhe espanca, numa batalha em que, apesar de árdua, já se sabe quem será o vencedor. Não é fácil para um homem derrotar um muro. O fim da vela é uma flor iluminada, é uma mesa de centro bonita de presépio.

A flor de fogo sacode. Avisa desesperada ou excita-se sob a proximidade do fim, a eternidade: nosso amor era um pavio. O pavio não deixa rastro, o pavio nunca existiu; o pó.

Deixo o cachimbo, ainda com fumo, que acendia com o fogo da vela. Reparo nas sombras que me traíram, omitindo-se de confirmar a minha versão dos fatos, o que quis dizer confirmar a sua; a sua versão filha da puta e mentirosa dos fatos. Os seus fatos. 

Minha mão se movimenta independente de mim: falta muito pouco para nada. Tento fazer como daquela vez, sentir o meu corpo em ligação com uma parte do que eu espero. Estou num dia pouco inspirado. Talvez devesse ter escolhido um dia melhor para, finalmente, descer. (Velas parecem com crianças, que parecem com a vida: quando se está sempre observando, nunca se percebem as mudanças.)

Passo um a um por meus pensamentos. Retiro à força suas mãos da minha cabeça, de que querem se apropriar; sigo meu caminho. Essa obstinação não me vem todo dia. Pouco inspirado, mas obstinado, fiz a opção certa, terra. Só espero que a vela ainda me permita pensar um pouco mais, sobre ela.