domingo, 30 de setembro de 2007

Linguagem oficial

Gente: Vidomar Silva Filho é nosso correspondente em Florianópolis. Nossas boas vindas a ele.

Fonseca olhava Juninho (foi assim que o traste pediu para ser chamado desde o primeiro dia) se exibindo para as mulheres do setor. Aquelas éguas não podiam ver carne nova. Nem as casadas se davam ao respeito. Um verdadeiro absurdo!
Trinta anos de serviço público para ver aquilo. Também, esses concursos: só uma prova, sem uma entrevista, uma indicação...
Nos primeiros dias, Fonseca até o achou simpático. Notou aquelas calças justíssimas que retratavam as nádegas, a musculatura das coxas, o sexo. Pensou em chamar a atenção do rapaz, mas deixou passar. Como deixou passar as camisas escandalosas que deixavam o peito à mostra no melhor estilo cafetão.
Só começou a se incomodar realmente ao ver os primeiros memorandos e ofícios:
– Juninho, pedimos não, meu filho. Usa a linguagem oficial: vimos solicitar.
– Dá tudo na mesma, seu Fonseca.
– Dá não. Se você não usa a roupa... quer dizer, a linguagem certa, não te levam a sério.
Incomodou-se também quando Juninho trouxe as brincadeiras pesadas do futebol para dentro da repartição:
– Daí, viado!
– Daí, boiola! respondia-lhe um outro no mesmo tom.
– Daí, Fonseca, seu corno.
Sorriso amarelo era a melhor resposta. Solteiro e celibatário, tecnicamente nem podia ser corno.
E continuava o desrespeito à linguagem oficial:
– Juninho, requerimento não se fecha com cordialmente, porque...
– Pô, Fonseca, deixa de ser fresco! – o sorriso largo tirava o peso do xingamento.
– Quando você tiver três décadas de serviço público como eu, vai entender a importância de usar linguagem oficial. É questão de precisão, garoto.
No dia seguinte, o Juninho resolveu atender o desejo de Fonseca:
– Daí, Fonseca, seu homossexual.
Os colegas tiveram trabalho para arrancar as mãos de Fonseca do pescoço de Juninho.


Vidomar
setembro de 2007.

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